Entrevistamos a nova presidente do IAB

21/01/2021 | Notícia | Revista Arquitetura & Aço

A equipe da Revista Arquitetura & Aço realizou nesta edição uma entrevista exclusiva com a arquiteta e urbanista Maria Elisa Baptista. Ela é a primeira mulher a presidir o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) em 100 anos. A mineira, que foi empossada no final de setembro deste ano, conta sobre suas prioridades, desafios e fala sobre a importância da construção em aço para a arquitetura brasileira e o futuro da profissão.

Depois de quase um século, você é a primeira mulher a presidir a IAB. Como se sente?

Alegra-me ser uma mulher a presidir o Instituto de Arquitetos do Brasil. Espero que, ao lado dessa conquista de todas nós, representemos a desconstrução das manifestações patriarcais em todos os seus aspectos no âmbito da profissão, da sociedade e das instituições.

Quais são as suas prioridades? E os principais desafios?

Os desafios e as prioridades se confundem, nesse momento. O IAB tem uma longa história ao lado das forças progressistas e democráticas, e um trabalho incansável na divulgação da boa arquitetura. Essas duas vertentes se aproximam, diria que são indissociáveis. Assim, defender o caráter civilizatório, libertário e a dimensão cultural da arquitetura, consolidar o papel social da profissão, resistir ao desmonte violento dos direitos sociais, refletir, debater, propor são nossas prioridades e nossos desafios.

Em 2021, teremos dois grandes momentos na vida do IAB e da arquitetura brasileira: a celebração do centenário do Instituto, cujas comemorações começam em 26 de janeiro, e a realização do Congresso Mundial UIA2021RIO, em julho, no Rio de Janeiro. São escalas e alcances diferentes, claro, mas de grande importância para nós. Os preparativos têm sido intensos, e esperamos receber arquitetos do mundo inteiro no Congresso, que já conta com uma programação interessantíssima, sob a bandeira “Todos os mundos: um só mundo”. 

A comemoração dos 100 anos incentivou e aprofundou pesquisas de toda ordem sobre nossa história, uma história rica e que ficará disponível para pesquisadores, arquitetos, estudantes e o público em geral.

Ao mesmo tempo, nossas atividades continuam, como a ampliação e a consolidação da participação no Fórum de Entidades em defesa do Patrimônio, concursos de arquitetura, seminários e atuação junto às entidades internacionais 
de arquitetos.

Vamos falar um pouco sobre os impactos da pandemia. Presidente, quanto tempo o mercado levará para superar essa crise?

O mundo nos exige, hoje mais que nunca, um olhar ativo, sem saudades. É que os problemas que enfrentamos já se anunciavam antes da pandemia, e, se foram agudizados por ela, também trouxeram o mérito de se revelarem em toda a sua extensão. Nós consumidores precisamos, urgentemente, rever nossas prioridades, cuidar para que nossos desejos não sejam instrumento de destruição ambiental ou aumentem a injustiça social. 

A produção, no campo da arquitetura e do urbanismo, tem grande responsabilidade nos rumos que nossas cidades tomarão. A prioridade deverá ser melhorar as condições de vida do conjunto da população. Saneamento, transporte, creches, escolas, postos de saúde, espaços públicos, moradias, recuperação de edifícios e estruturas, a lista é grande. Há muito a fazer, e não pode ser mais do mesmo.

Existe uma frase célebre do estadista britânico Winston Churchill: “Nunca desperdice uma boa crise”. Maria Elisa, quais as oportunidades que os impactos provocados pela Covid-19 trouxeram para os arquitetos brasileiros?

Penso que a oportunidade para nós, arquitetos e urbanistas, é a de afirmar a importância da arquitetura na vida das pessoas. Buscar modos de atuar efetivamente para melhorar a qualidade de vida nas cidades, as condições de salubridade, preservar e criar espaços inspiradores. Principalmente, dedicarmo-nos à pesquisa de soluções realmente inovadoras.

Novos hábitos, novos comportamentos, o consumidor mudou muito?

As pessoas perceberam o quanto é importante ter uma casa em que possamos morar, com alegria e tranquilidade. Mas é preciso pensar no que significou a impossibilidade de manter distanciamento social e hábitos exigentes de higiene para a maioria das famílias brasileiras, que moram, quando moram, em lugares precários, muitas vezes sem água tratada, esgoto ou coleta de lixo. Essas pessoas devem ser o centro de nossos empenhos e ações.

Também estão mudando as percepções sobre os percursos nas cidades, com a busca por uma vida mais centrada no bairro, que possamos percorrer a pé, de bicicleta. Também aí não há novidade, mas uma atualização de conceitos bem conhecidos.

Algumas mudanças nos modos de conceber espaços também apontam um retorno a valores importantes: a ventilação natural, a incidência direta do sol, o uso dos lugares abertos. Há necessidade de espaços de transição na chegada à casa, onde possamos deixar os sapatos, lavar as mãos. Precisamos pensar em espacialidades que possam abrigar a vida familiar e o trabalho, que simplifiquem a manutenção, que possibilitem às crianças ter liberdade e serem criativas.

O tema principal da revista é a construção em aço. Qual a importância do sistema construtivo em aço para a arquitetura?

O aço possui propriedades de resistência excelentes e sua tecnologia de fabricação é dominada já há muito tempo. O grande conhecimento de suas propriedades e o domínio de seu processamento permitiram o desenvolvimento de sistemas construtivos de alto desempenho estrutural, com racionalidade no processo de construção e montagem. O sistema construtivo em aço é também bastante exigente em termos de projeto e detalhamento, e resulta em obras mais limpas e mais bem acabadas. Tudo isso faz do aço um importante material estrutural à nossa disposição hoje.

Na sua opinião, em que tipos de projetos o sistema construtivo em aço deve ser utilizado? 

O sistema construtivo em aço pode ser usado em qualquer tipo de projeto. Pelas suas características deve ser utilizado sempre que o projeto buscar um elevado desempenho estrutural, por exemplo, em espaços de grandes vãos, e exigir rapidez, industrialização e racionalidade na obra.

É um material magnífico para a recuperação de algumas estruturas, e, nesse aspecto, importante aliado das obras de preservação do patrimônio. É também elemento imprescindível em algumas obras de infraestrutura urbana. A rapidez de execução é outro aspecto a ser levado em conta, assim como as alternativas de desmonte e reutilização. Importantíssimo para a arquitetura de emergência ou transitória, como hospitais, abrigos, feiras de grande porte.

Quais os benefícios que o sistema construtivo em aço oferece?

Os principais benefícios são a alta resistência mecânica do aço, a segurança e conhecimento de suas propriedades e processamento, e a possibilidade de industrialização e racionalização do sistema construtivo. Uma questão interessante é a flexibilidade que o sistema de aço permite para a concepção estrutural da Arquitetura. Com a tecnologia atual CAD/CAM é possível a fabricação de elementos de barras e conexões de variadas dimensões, permitindo a construção de edifícios de formas complexas e orgânicas a partir dos sistemas de aço. Essa característica torna inclusive o sistema de aço como principal sistema utilizado em relevantes obras da Arquitetura Contemporânea.

O IAB e o CBCA são parceiros. Na sua opinião, qual é a importância do CBCA na formação de novos arquitetos e na promoção do uso do aço na construção civil? 

A informação disponível e de qualidade é o mais importante na formação dos futuros arquitetos, e de todos nós, estamos sempre a estudar e a aprender. Essa parceria é preciosa para nós que atuamos em um campo no qual a atualização constante é vital.

Como aproveitar a visão dos jovens? 

Acredito que o mundo é mutável, e que cabe a nós transformá-lo, mesmo que não vejamos essa transformação em nosso tempo de vida. O entusiasmo dos jovens é uma alegria, e será com eles que conseguiremos construir os caminhos para promover o acesso à arquitetura e ao urbanismo por todos os setores de nossa sociedade, sobretudo, pelos mais pobres. Tal esforço vai ao encontro das aspirações das novas gerações de arquitetos e arquitetas, para as quais o acesso e a permanência na atuação profissional são um enorme desafio. Há muito trabalho a fazer, na busca de modos inovadores de promoção de uma arquitetura generosa, democrática, responsável.

Para fechar com chave de ouro. Roterdã, na Holanda, é considerada a cidade do futuro. Para você, qual é a cidade mais inteligente do Brasil? 

Temos cidades incríveis, mas não conheço nenhuma que tenha resolvido seus espaços de modo a abrigar todos os seus moradores com dignidade, beleza, alegria. Ainda temos muito chão a percorrer, a recuperar o que perdemos, a preservar o que ainda temos, e a construir um futuro que valha a pena. 

Veja a matéria na íntegra.

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