12/01/2015 | Notícia | Revista aU – Arquitetura e Urbanismo - Edição 249 - Dezembro/2014
No alto de um morro e em meio a comunidades em situação vulnerável, o colégio assinado pela equipe de Mazzanti se propõe a levar educação ao bairro - para crianças e adultos - e também atuar como um estopim para a transformação do entorno, passando a ser um marco de apropriação e de orgulho dos moradores.
Nem igreja, nem fortificação militar. É uma escola que coroa o topo de um dos mais proeminentes morros em Lomas del Peyé, uma região em situação de vulnerabilidade social na periferia da cidade histórica de Cartagena, na Colômbia, marcando a paisagem e postulando uma identidade possível para a comunidade local.
Ali, um conjunto de 11 bairros surgiu ao longo dos últimos 15 anos como produto de remoções forçadas realizadas em outras partes da cidade. Os resultados não são difíceis de imaginar: famílias já flageladas por significativos níveis de pobreza precisam lidar com a precariedade de acesso a serviços públicos como saneamento, educação e saúde.
O novo colégio é obra da Fundación Pies Descalzos, organização não governamental criada pela cantora Shakira no fim da década de 1990, e integra sua sexta parceria com diversas municipalidades colombianas para construir ambientes adequados para a prática pedagógica em escolas públicas.
Além da qualidade dos espaços construídos - ou reformados - o diferencial das instituições entregues pela Pies Descalzos está na oferta de ambientes designados não apenas aos alunos e professores, mas às famílias e à comunidade, visando à implementação de atividades extracurriculares que impulsionem o desenvolvimento da região.
"Este projeto deve otimizar as condições de vida das pessoas, gerando alternativas de desenvolvimento pessoal e comunitário, e deve iniciar a transformação de seu entorno e ao mesmo tempo se converter em um marco urbano, símbolo da cidade que gere apropriação e orgulho em seus habitantes", explica o arquiteto Giancarlo Mazzanti, à frente do projeto da nova escola.
O terreno escolhido para o colégio contribuiu para a manifestação de sua vocação como edifício-símbolo: a propriedade do Fundo de Habitação de Interesse Social e Reforma Urbana do distrito de Cartagena (Corvivienda) fica no alto de um monte, na intercessão entre um ecossistema de pântano e um de montanha. A expectativa é que a nova construção funcione como barreira ambiental para deter a expansão urbana sobre a natureza na área.
A escola chama a atenção dos moradores do entorno não apenas por sua proeminente localização, mas por seu partido arquitetônico pouco usual, que articula três volumes de planta hexagonal - cada um com uma saliente estrutura em balanço - com uma original torre, cuja função é a de um pergolado: conformar o espaço e gerar sombra. No projeto, estão previstas três torres - uma sobre cada um dos pátios -, e a expectativa é que em 2015 a escola consiga reunir doações para construir as duas estruturas que ainda faltam.
A pérgula tridimensional tem estrutura metálica pré-fabricada em perfis tubulares cilíndricos e é coberta por ripas de madeira laminada instaladas in situ, dispostas em diferentes ângulos. Sua materialidade volta a aparecer na vedação lateral de todo o conjunto, fazendo com que vistas permeiem o ambiente escolar, na forma de brises verticais, que ora são encontrados sozinhos, assumindo o caráter de um gradil, ora são associados com panos de vidro na delimitação de salas de aula e outros espaços internos. A pérgula e os brises integram uma mesma estratégia de controle passivo da térmica do edifício: as peças de madeira criam sombra sem interromper o fluxo da ventilação natural.
Outra solução ambientalmente amigável, prevista em projeto, mas ainda não executada, é a cobertura de extensas áreas de laje com vegetação. A expectativa é que essas soluções, somadas à criação de microclimas com o plantio de exuberantes representantes da tropical flora caribenha nos pátios, possam reduzir em até 2ºC a temperatura dos ambientes internos. O telhado verde deve ajudar também no controle da acústica do edifício: enquanto a mata existente no entorno já deve reduzir o volume sonoro que chega ao topo do morro em cerca de 40 dB, a cobertura pode baixá-lo em ainda outros 20 dB, visando à meta de confortáveis 60 dB.
Com 14 mil m² construídos, o colégio abriga 49 salas de aula para educação infantil, ensino fundamental e médio e formações técnicas, além de salas especializadas, biblioteca, auditório/ refeitório e áreas esportivas. Sua implantação dialoga com a topografia do morro: os três hexágonos e as duas quadras esportivas organizam-se em dois níveis distintos, conectados por rampas que serpenteiam nos limites dos pátios internos e por escadas locadas em pontos estratégicos.
Cada um dos anéis vê uma de suas faces avançar, em balanço, por sobre o monte: essas são as salas com usos especiais, como artes e música. Suas enormes janelas "reafirmam uma conexão visual com a cidade ao longe", afirmam os arquitetos.
Para a equipe, os conceitos que nortearam o projeto foram a integração espacial, a inclusão social, a geração de uma forte imagem urbana e a implementação de uma arquitetura bioclimática e ambientalmente sustentável. Entre o desenho e sua materialização, um caminho tortuoso se insinuou antes mesmo do início das obras: "o lugar onde se localiza o colégio não tinha nenhum tipo de infraestrutura urbana, razão pela qual foi necessário pavimentar as vias e levar redes de serviços públicos", lembram-se. Toda a infraestrutura foi doada pela fundação de Shakira. Se os pés são descalços, o morro de Lomas del Peyé já pode contar com um bom chapéu.
DADOS DA OBRA
Área Construída: 11.200 m²
Custo Total Aproximado da Obra: 550 dólares/m³
FICHA TÉCNICA
Arquitetura: Giancarlo Mazzanti Gerente associado Juan Manuel Gil AntePROJETO Nestor Gualteros, Rocio Lamprea
Desenvolvimento do Projeto: Fredy Fortich, Rocio Lamprea, Liv Johana Zea, Diego Castro, Maria Sol Echeverri
Estagiários para Apoio no Desenho: Stephany Zapata, Juliana Alzate, Andres Correa, Jessica Jaramillo, Samir Abu-Shibab, Santiago Rincon, Fabvio Caicedo, Alejandra Loreto, Christelle Tsikras, Manuel Gutierrez
Gerente de Projeto: Juan Andres Lemus
Engenheiro Estrutural: Nicolás Parra
Estrutura Estructural: CNI Ingenieria
Construção: Metropoli
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